Cidade dos vagalumes, Laranja da Terra, Itabirinha, e O Fim do Contestado (MG/ES)
Leonina Fortunato Heringer conta suas aventuras de criança em Laranja da Terra, municipio de Iúna, E.S. e Itabirinha, que na época se chamava Itabira e ficava na faixa do Contestado ou Zona Litigiosa, reclamada por Minas e Espirito Santo. Um evento acontecido com um parente de sua mãe, culminou quase em guerra entre policiais de Minas e Espirito Santo, levando os dois governadores, Magalhães Pinto e Francisco Lacerda de Aguiar, a assinar um acordo, demarcando a divisa entre os dois estados.
domingo, 31 de maio de 2020
quarta-feira, 1 de março de 2017
sexta-feira, 1 de abril de 2011
Parte I- Laranja da Terra
Parte I
Laranja da Terra (município de Iúna, Espírito Santo,nascimento até 7 anos)
"
Meus pais tinham o seu próprio pedaço de terra, que consistia de uma plantação de café, um bananeiral, um pomar com todos os tipos de laranjas e uma variedade de frutas, além da horta no terreiro da casa, com verduras, couve, alface, taioba, serralha, almeirão e plantas medicinais, para fazer chazinhos. E um livro de Homeopatia e, mais tarde, outro com o título de “As plantas curam” que meu pai usava para nos tratar quando ficávamos doentes.
Primeira casa dos meus pais Norival e Erandi |
Sou a filha mais velha e meu pai, contava que eu já estava grandinha, mas não abandonava meu bico de borracha fina, vermelho (tipo balãozinho), mas ele me convenceu a jogá-lo para as galinhas.
Ainda posso sentir o gosto das mexericas enormes, plantadas no cafezal do grotão, do caldo de cana espremida na engenhoca perto da cachoeira do córrego e dos inhames que meu pai cozinhava num tambor de querosene para tratar dos porcos. Minha irmã Etelvina, (somente treze meses mais nova do que eu e companheira inseparável) e eu, enfiávamos os dedos nos inhames ainda meio quentes, e como eram gostosos mesmo sem sal ou qualquer tempero... Nos fundos da casa havia uma tulha, onde eram guardados os grãos, arroz, milho, feijão e cachos de bananas pendurados para madurar, para serem consumidos por nós, pelas galinhas e porcos também. Adorávamos espremer as bananas-ouro direto na boca.
Quase todas as vezes que o meu pai ía a Lajinha, a cidade mais próxima, sozinho ou conosco, comprava Toddy, aveia para fazer mingau, biscoitos Maria, rosca seca, que a gente comia molhando no café com leite ou na água doce, quando estava doente, e azeitonas. Eu era louca por azeitonas, que eu chamava de "frutinhas" . Minha mãe contava que, certa vez, quando era muito pequena, comi tantas azeitonas sem mastigar direito que, `a noite, tive uma grande dor de barriga. Na tentativa de diminuir os gases, meu pai fez uma massagem. Soltei um tiroteio de frutinhas nele.
Ele sempre ajudava minha mãe em todas as tarefas da casa. No domingo de manhã, cortava nossas unhas e checava nossas orelhas antes de tomarmos banho e vestirmos os vestidos que minha mãe costurara para nós, alguns bordados e sempre engomados, para irmos para o culto na Congregação Batista, que funcionava na casa anexa `a venda do tio Gil, irmão da minha mãe.
Todas as manhãs, meu pai saía cedo para a lavoura de café, no morro depois do rio. Por volta das dez e meia, minha mãe pedia para que o chamássemos para vir almoçar.
"Pai...ê!!!!", gritávamos com toda a força. E ele respondia da maneira que nunca vi ninguém mais responder: "Ê... eu..." Dali a pouco, estaria almoçando conosco, ele e minha mãe na mesa grande, nós na mesinha que ele havia feito, com três banquinhos de tamanhos diferentes, um para mim, um para Etelvina e outro para Aneci, uma garota que estava morando com a nossa família na época e ajudava minha mãe na casa, pois ela, além de costurar para fora, ensinava corte e costura. Eu achava interessante quando a Anita, filha da tia Lilica, irmã do meu pai e aluna de corte e costura da minha mãe, que é a única de que me lembro, montava os vestidinhos de papel.
Então comecei a chorar, não um choro normal que eu choraria se não tivesse que explicar a minha travessura. Decidi me fazer de vítima e, quando cheguei em casa chorando copiosamente, disse aos meus pais; "Por favor, não me deixem fugir outra vez, senão eu caio da pinguela."
Etelvina sempre foi uma criança muito esperta. Apesar de ser treze meses mais nova do que eu, prestava atenção a tudo o que estava acontecendo, até `a mudança do tempo. Certa vez, estava com jeito de chuva e ela falou pro meu pai "Ô pai, precisamos guardar essa lenha, porque vai chover."
vezes, meu pai comprava vidros grandes de "ovinhos de garrincha", como ele chamava os amendoins torrados cobertos de chocolate, diretamente do caminhão. Certa vez, ele encontrou-se com o caminhão na estrada e comprou duas latas de biscoito decoradas, para mim e Etelvina, e pediu ao motorista que parasse lá em casa e fizesse a entrega . Estávamos brincando no tereiro, quando o caminhão parou e o homem nos entregou as latas, sem maiores explicações. Ficamos radiantes e não podíamos acreditar no que estava acontecendo, tinha que ser um milagre. Corremos para dentro, para mostrar para a nossa mãe, os presentes que havíamos ganhado do "Homem da Confiança". Minha mãe não disse nada, pois também não sabia a origem das latas, mas não se preocupou. Não havíamos saído e alguma explicação haveria para o ocorrido.
Apelidamos nossas latas de biscoito de "baús" e, algum tempo depois, quando entramos para a escola, usávamos os nossos "bauzinhos", as latas, para colocar os objetos escolares. Anos mais tarde, depois que nossa irmã Clarinda nasceu e já tinha uns dois anos, meu pai perguntava se ela queria ir para a escola e ela respondia que não, pois "não tinha láspi e nem baú".
Uma vez por ano ou mais, era tempo de fazer farinha, no galpão ao lado das tulhas de guardar café, perto da venda do tio Gil. A família toda, meus pais, tios, tias, Vovó Leonina e uma turma de empregados, estariam ocupados em descascar, ralar e prensar mandiocas para fazer a farinha. Por meses ou pelo ano, teríamos farinha para fazer farofa, o polvilho para os biscoitos e brevidades, que eram assados todos os sábados no forno grande na varanda da fazenda do Vovô Américo. Durante as semanas em que a fazeção de farinha estava acontecendo, a comida vinha da casa do vovô em bacias grandes; o arroz, o feijão, a carne, o angu e a verdura, cada qual num canto. Era uma verdadeira festa para nós, crianças.
Família da vovó Etelvina (assentada). Em pé: Tio Astrogildo, meu pai (Norival), tio Nolmerindo, tio Atardes, tio Osvaldo, tia Valmerinda, tia Lilica (Maria) e tia Valmira |
Tia Valmira, irmã do meu pai, casada com o tio Raivil, primo da minha mãe, era a única que morava do outro lado, perto da Fazenda do Tio Lindolfo, irmão do vovô Américo e pai do tio Raivil. Passando pela estrada, eram uns três quilômetros, mas cortando pela lavoura no alto da pedreira, chegava-se em pouco mais de uma hora de caminhada morro acima e depois morro abaixo. Lá havia as melhores jabuticabas que já comi e ela sempre fazia um biscoito de polvilho frito, delicioso.
Na maioria das vezes, usávamos o caminho pela casa da tia Julica, irmã da Vovó Etelvina, e aproveitávamos para visitá-la. Algumas vezes, parávamos na casa do tio Eusláquio, irmão da Vovó Etelvina também. A outra irmã dela, tia Filhinha, morava bem perto da Vovó Etelvina, acima do açude do tio Nolmerindo, e íamos lá frequentemente também.
Casa da Fazenda do Vovô Américo |
Na manhã seguinte, ainda com escuro, meu pai chegou, explicando para nós que a Vovó Leonina havia morrido de repente, na noite anterior. Eu era muito chegada `a minha avó, de quem herdei o nome. "Ó meu Deus, como é que vou arranjar outra avó tão boa como a Vó Nina?", falei. Minha irmã Etelvina, um ano mais nova do que eu, que recebera o nome da outra avó, e que parecia ter solução para tudo, depois de ter perguntado onde é que a vovó tinha ido e ter sido informada de que ela estava no céu, perguntou: "Por que a gente não leva um remédio pra ela, lá no céu, pra ela sarar e ficar boa?"
Fiquei sabendo depois, que meus pais ainda estavam na cozinha na noite anterior, depois de nos colocarem na cama, quando ouviram os gritos da tia Ilca "A mamãe morreu..."
Minha mãe (Erandi e vovó Leonina) |
Não me lembro muito do dia do enterro, exceto de que foi um dos piores dias da minha vida. A casa do vovô estava cheia de gente e por algum tempo, que pode ter sido apenas uns cinco ou dez minutos, mas que para mim parece ter sido uma eternidade, fiquei perdida no meio daquela multidão, indo de um cômodo para o outro, sem encontrar nenhum parente ou conhecido, apesar de quase todos serem parentes ou conhecidos.
O de que eu me lembro perfeitamente é da minha avó dentro do caixão no terreiro, ao lado da longa escada de cimento da porta da frente, o seu rosto sereno, como se estivesse dormindo e do culto em que cantaram os hinos do Cantor Cristão próprios para a ocasião, dos quais não me lembro, mas possivelmente o 508 do cantor Cristão "Eu avisto uma terra feliz..."
Os dias que se seguiram foram muito difíceis para toda a família. Mudamo-nos para a casa do vovô; ele precisava de ajuda. Dos treze filhos, oito ainda eram solteiros, alguns vivendo em casa, outros no internato do Colégio Evangélico em Alto Jequitibá ou no Ginásio Rui Barbosa em Lajinha; o mais novo, tio Filadelfo, com apenas sete anos.
Ainda me lembro do vovô, homem alto, forte, careca e de olhos azuis, assentado no longo banco de madeira na sala, ouvindo o rádio e fumando o cigarro de palha que preparava com toda a paciência. Estava muito deprimido e algumas noites, acordávamos de madrugada com ele cantando "Passarinhos, belas flores, querem me encantar... oh, vão celestes esplendores... eu quero já voar", que fala da saudade de Jesus e vontade de ir para o céu.
Pode soar muito estranho, mas para mim, de certa forma, apesar de sentir saudades da vovó, a vida ficou ainda melhor. Eu estava morando na casa do vovô, junto com tios e tias...
A fazenda produzia de tudo, milho, arroz, feijão, mas o principal produto era o café, que meus tios despolpavam para dar melhor classificação. A princípio, vendiam o café para o Alvino, como chamavam o Seu Alvino Heringer, sobrinho do vovô Américo, dono da fazenda vizinha. Mas depois passaram a comprar café também e o tio Gil tinha um grande armazém onde era feita a catação, para retirar impurezas e os grãos imperfeitos, operação que envolvia muitas pessoas, a maioria mulheres, em bancas montadas dentro da grande tulha. Eu adorava ajudar na catação.
A semana era movimentada na fazenda. A comida feita num fogão a palha de café; fogo intenso mas com pouca fumaça. A moega de madeira no lado de fora da cozinha, era conectada ao fogão por um tubo de metal com um registro, aberto de acordo com a necessidade. Por dentro do fogão passavam os canos da serpentina que esquentava a água do chuveiro. O forninho do lado do fogão quase não era utilizado para assar; o mais usado era o grande forno `a lenha da varanda. Mas no inverno, nós, crianças, assentávamos em cadeiras na beira do fogão e colocávamos os pés enrolados num cobertor dentro dele, para nos aquecermos.
Tio Gil, vovô Américo, minha mãe (Erandi), tio Joassi, tia Edil, tio Joanilson, tia Elma e tio Filadelfo |
Uma vez por semana, minhas tias e uma empregada de nome Ilda contavam casos e riam enquanto lavavam roupas num enorme tanque de cimento. As roupas eram postas de molho, ensaboadas, esfregadas `a mão e postas num tacho de água para ferver, exceto pelas domingueiras ou as que saíam tinta. A seguir eram colocadas para corar nos pés de capim cidreira na beira do terreiro; o sol tirava as manchas que restavam. Depois, batidas no batedouro, enxaguadas e penduradas no varal para secar. As camisetas e cuecas dos tios que estavam no internato eram marcadas com o nome, usando um carimbo esculpido na semente de abacate, a nódoa funcionando como tinta permanente. Água sanitária era usada para lavar as roupas brancas e, certa vez, meu tio Filadelfo tinha ido a Lajinha com o tio Gil e minha mãe encomendou uma garrafinha. Chegaram tarde e ele dormira na casa do tio Gil. Pela manhã quando vimos que o tio Filadelfo estava vindo na estrada, corremos para encontrar com ele. Caminhando, ele balançava a garrafinha escura na mão, enquanto contava como tinha sido a viagem. De repente, talvez por causa do movimento e dos gases formados dentro da garrafa, esta perdeu o fundo, derramando o líquido em cima de mim, que estava na sua frente. Tio Filadelfo ficou todo desapontado e corremos até em casa. O vestido xadrez de verde que eu estava usando começou a desbotar e a se rasgar em poucos minutos. Minha mãe me levou para o banheiro e me colocou debaixo do chuveiro, lavando com todo tipo de sabão que tinha em casa. Mas, por dias, eu fiquei com o cheiro de água sanitária que nenhum perfume conseguia eliminar.
A passação era um ritual noturno, e, `as vezes, deixavam que eu e minha irmã Etelvina passássemos as roupas menores.
Meu tio Filadelfo, apenas quatro anos mais velho do que eu, minha irmã Etelvina e eu, gostávamos de cantar hinos do Cantor Cristão durante estas noites, fazer jogos de barbante, jogar belisca, fazer gaita de papel no pente e outras brincadeiras. Todas as noites, também, minha mãe (Erandi) dirigia o culto doméstico, líamos a Bíblia, o “Manancial” (uma revista com a citação bíblica e a explicação), falávamos versículos e orávamos antes de dormir. E, `as vezes, tia Ilca, tio João ou tia Elma, tocavam o órgão e cantávamos acompanhando. Eu gostava de cantar “Cristo é quem nos manda como luz brilhar” e caprichava no “tu no teu cantinho... e eu no meu”. Ou o tio João, com a sua possante voz de tenor, iria tocar o órgão e fazer um solo “Jerusalém... Jerusalém”.
Quando o grande relógio de carrilhão da sala cantava “Hora certa, hora certa...” e dava sete badaladas, era a “Hora do Brasil” no rádio (depois mudou para “Voz do Brasil”) que começava com a ópera “O Guarani” (Tan...tan...tararan...tan...) e mantinha todos informados sobre os últimos acontecimentos mundiais, uma rotina solene que meu avô não perdia por nada. Na parede, o quadro dos dois caminhos, comuns em muitas outras casas, além de outros dois, um com a foto do meu bisavô João Carlos Heringer, pai do vovô Américo Marcelo Heringer e o outro com os pais da vovó Leonina de Freitas Heringer, vovô Filadelfo Mariano de Freitas e vovó Arminda Belarminda Soares de Freitas.
Minha mãe costurava para a família toda e para outras pessoas também. Nos dias de chuva, fazia roupas para as nossas bonecas e dizia que estava costurando para as netas. Ensinava a gente a pedalar a máquina Singer, que a princípio era difícil fazer andar só para a frente. Para praticar, ela nos deixava costurar papel, sem linha na agulha. Quando ficamos maiores, ela nos ensinou a fazer roupas para as bonecas. Etelvina, mais nova do que eu, fazia os vestidinhos com detalhes, bolsos, golas e modelos complicados; eu fazia os meus o mais simples possível. Aliás, ela sempre foi alerta e cuidadosa com tudo. Certa vez, meu pai foi ao Rio de Janeiro e comprou uma boneca enorme para ela e um boneco para mim. O meu chamava-se Gabriel. A dela, eu nem me lembro, pois durou pouco. A boneca era de papelão e ela deu-lhe um banho caprichado que dissolveu-a todinha. Mas mesmo os nossos bebezinhos de borracha ganharam todo o cuidado dela. Cortou as unhas (dedos) das bonecas.
No dia de matar capado, o movimento começava cedo. Etelvina, eu e tio Filadelfo, descascávamos bastante alho. Meu pai (Norival) depois de dar uma machadada com a parte não cortante na cabeça do porco, levantava a pata dianteira do animal e perfurava com a faca na altura do coração, com o cuidado de ter uma vasilha que coletava o produto, para fazer o chouriço de sangue. Depois cobria-o com palha de milho e ateava fogo, tirava água fervente do tacho e ía entornando sobre o bicho e, com uma faca bem afiada, raspava a pele eliminando pelos que houvessem resistido ao fogo. Um corte na barriga e retirava os órgãos internos. Minha mãe e minhas tias, além da Ilda, a empregada, iriam cozinhar, fritar a carne, fazer linguiça e chouriço de miúdos e chouriço de sangue, rechear o bucho... E o cheirinho era irresistível. Eu gostava de comer o miolo do porco, pois diziam que era bom para o cérebro. A carne frita era colocada em latas de querozene limpas, junto com a gordura, e podia ser consumida por muito tempo sem que estragasse. O sabão preto, usado para lavar a roupa, era feito com "diquada", o produto de água passada pela cinza num barrileiro, e restos de torresmo do qual se havia espremido a gordura e outras partes do porco que não serviam para comer.
Não me lembro se a cozinha da fazenda era de chão batido quando nos mudamos para lá, mas sei que num canto da cozinha, onde ficava o filtro de água, houve uma época em que se abriu um buraco que nós chamávamos de Japão. Se cavássemos um pouco mais, chegaríamos do outro lado do mundo...
O quintal da fazenda tinha muita laranja de todos os tipos, lima, campista, cravo (minha favorita) e manga, além do pomar perto da venda com aquelas jabuticabas pretinhas, e as mexericas enormes do grotão... Quando chegava a época das goiabas, o movimento era grande. Colher, limpar, cortar, cozinhar, moer ou passar na peneira e finalmente secar no tacho até chegar `a consistência de colocar nas caixas retangulares de madeira, que conservava o ano todo. Goiabada em pedaço, calda ou cascão, comida com queijo em pedaço ou ralado, que sobremesa gostosa! Os queijos eram feitos em formas redondas de madeira e depois enrolados em panos de saco e colocados numa tábua na parte de cima da janela do lado de fora da cozinha para madurar (maturar) . Todos os dias, eram retirados para serem esfregados com sabugo, lavados e colocados novamente para curar até o ponto desejado.
Na colheita do milho, descascar, moer o milho verde na máquina de moer carne, passar na peneira para tirar a bucha e fazer pamonha e papa (ou mingau de milho verde). E algumas das espigas com seus cabelinhos ruivos, viravam nossas bonecas também.
Quando chovia o bastante para encher a vargem, Vovô Américo pegava a “Flaubert” e, com boa pontaria, atirava nas traíras, sem perder nem um tiro. Frango para o almoço? Havia duas opções: pedir ao vovô para matar com tiro (uma vez matou dois com um tiro só) ou mostrar o frango desejado para o Campeiro, o cachorro preto do tio Filadelfo, que o trazia sem machucar.
Certa vez, o campeiro fugiu. Depois de vários dias, alguém falou para o meu pai que o havia visto em Crisciúma, um córrego a mais ou menos sete quilômetros de distância. Meu pai foi lá, de caminhão, buscá-lo. Para improvisar uma coleira, usou embira de bananeira trançada, amarrada num pedaço de pau e o trouxe para casa. Tio Filadelfo ficou muito feliz.
Lembro-me de que uma vez em que ele perguntou pra minha mãe: "Erandi, você deve ser uma pessoa muito feliz, não é?" Ela respondeu que sim e ele complementou: "O Norival é muito bom pra você."
Depois que o Campeiro morreu de velhice, tio Filadelfo teve um cachorro castanho chamado Rojão, que o seguia onde ele fosse.
Certa vez, minha mãe foi para um congresso das senhoras na Igreja Batista de Chalé e deixou a Etelvina e eu na casa da tia Lilica, irmã do meu pai. Tio Filadelfo ficou com o vovô. Uma tarde, ele apareceu na casa da tia Lilica. Na verdade, não na casa, mas no terreiro, atrás da tulha, perto da estrada. Tinha os olhos vermelhos e parecia ter chorado. Perguntei-lhe o que havia acontecido e ele simplesmente me disse, entre soluços "Aquele veado... ele viu o cachorro sim".
Um homem chamado C, que tinha uma máquina de limpar café havia atropelado e matado o Rojão. Tentei consolá-lo e fazê-lo acreditar que teria sido um acidente, mas ele dizia que não. Comecei a chorar junto com ele. Fiz de tudo para convencê-lo a entrar na casa da tia Lilica, mas ele não quis. Ficamos assentados os dois por um bom tempo e depois ele foi embora.
Nos três dias em que Etelvina e eu ficamos na casa da tia Lilica, aprendi a andar de bicicleta, uma bicicletinha de criança do meu primo Ailton, filho do tio Ataídes. Fiquei tão excitada com a minha nova habilidade que, quando minha mãe apontou lá no morro, vindo a pé, a uns quinhentos metros de distância, de onde se avista a Serra do Caparaó, onde fica o Pico da Bandeira (terceiro mais alto do Brasil, com 2.891,32 metros de altitude) eu a vi e comecei a gritar "Ô mãe, eu aprendi a andar de bicicleta". Ela não estava entendendo, e eu repetia mais alto: "Eu aprendi a andar de bicicleta".
Quando chegamos em casa, tio Filadelfo já estava melhor.
No dia em que Etelvina e eu voltamos de Manhumirim trazendo caixinhas com brincos, uma meia lua de ouro com um rubi na parte inferior mais larga, estávamos tão excitadas que não pudemos nem mudar de roupa antes que minha mãe furasse nossas orelhas. Ela, que era a enfermeira oficial do córrego e tinha prática no ofício, pegou uma cortiça, colocou na parte posterior de cada orelha, desinfetou uma agulha com álcool e furou com mão firme. Doeu bastante, mas não choramos nem demos sinal de que havia doído.
Pouco tempo depois que a vovó Leonina faleceu, fomos a Itabira, no Norte (do Rio Doce), visitar os parentes, vovô Filadelfo, meu bisavô, pai da vovó Leonina, tio Reginaldo, irmão dela, tio Adiles e tia Elzina, tio Joel e tia Jeny, tio Jeronil e tia Adenair.
Meu pai perguntou a ele por que não havia falado nada, pedido algo para comer, mas ele, adolescente e tímido, não o faria. E o fato de ser adolescente talvez tenha contribuído para que a fome fosse maior.
Etelvina, Clarinda e eu (Leonina) |
Clarinda se tornou o xodó da casa, gordinha e rechonchuda e tinha o apelido de “Lindinha”. Tio Jenus lhe ensinava a cantar e a dançar umas musiquinhas apimentadas "Dançá agarradinho é bom, namorá agarradinho é bom... Fico todo mole-mole, todo sujo de baton..." e "Eu tava na peneira, eu tava peneirando... Eu tava no namoro, eu tava namorando..." Era muito engraçadinha. Lembro-me de uma vez em que alguém estava viajando para Itabira e ela disse que era para dar um abraço no tio Jenoril (Jeronil), tio Zé Rinaldo (Reginaldo) e em todo bichinho de orelha..."
Quando passávamos em qualquer ponto mais alto da estrada montanhosa da região e dava para ver as encadeadas montanhas azuis do Caparaó, ela dizia: "Olha lá o Macaraó".
Clarinda era muito mimada por todos, era o nosso bebê. Além disto, tinha bronquite asmática e por dias a fio ficava doente. Etelvina, apesar de pequenininha, cuidava dela, dava banhos e contava histórias para ela. Só que ela tinha a personalidade muito forte e quando queria alguma coisa, como o balanço que tínhamos no pé de goiaba no terreiro, não pedia, simplesmente tínhamos que sair e deixar para ela, imediatamente. Senão, eram mordidas e tapas, que não revidávamos. Uma vez, eu estava no balanço e me recusei a sair. Ela, então, subiu no pé de goiaba e quando vi, estava sendo molhada do xixi dela. Até que um dia, tia Edil me disse "Da próxima vez que a Clarinda te bater ou morder e você não fizer nada, vou te bater também". Clarinda nunca mais me bateu ou mordeu.
As três sobrinhas com tio Filadelfo |
Não era tradição para nós, comemorar aniversários. Possivelmente porque havia sempre tanta gente na fazenda que o dia a dia já era uma festa. Além disto, a ênfase era dada a alimentar tantas pessoas quantas fosse possível e não gastar com festas (nunca ouvi nada sobre isto; eu suponho que pensassem assim). Também, ninguém na casa era especialista em confeitar bolos, e, se fôssemos comemorar todos os aniversários com festa, provavelmente haveria uma festa por semana. Quando completei seis anos, entretanto, lembro-me de que houve um culto de oração lá em casa, com café com leite e broa, seguido do "Parabéns pra você". E o resultado foi ótimo. Ganhei algumas notas de um cruzeiro e uma lata de Pó de Arroz Lady (que se pronuncia ''lêide", mas que pronunciávamos "ladi" mesmo).
Numa época, minha mãe trouxe uma filha de uma prima dela, Marta, que estava noiva, para a nossa casa e estava fazendo todo o enxoval de casamento dela. O noivo se chamava Mário.
Num dia em que faltou água na casa do vovô, possivelmente porque os animais haviam arrebentado os canos ou coisa assim, tia Edil, tia Elma e Marta foram lavar roupas no rio. O dia estava quente e elas começaram a brincar de jogar água uma na outra, até que ficaram todas molhadas.
Quando, `a tardinha, o noivo, Mário, chegou lá em casa, Etelvina foi correndo contar pra ele que a Marta havia tomado banho no rio.
O casamento foi na casa de outra prima da minha mãe do lado Freitas, Gessi do Ademar Heringer, que também era prima da Marta.
Alda e Alcali |
Alda era a minha amiga inseparável e quando a mãe dela mandava o Abel ir chamá-la lá em casa, eu a escondia na tulha de palha de café e ficava lá, como se não tivesse nem idéia de onde a Alda andava. Não gostava do Abel, principalmente porque minha tia Elma dizia que eu iria me casar com ele.
Não sei porque, mas houve um tempo em que não havia escola próximo `a fazenda, ou não havia professora, não sei bem. Só me lembro de que a Adelina, filha do Seu Manoel Beca, que tinha uns doze anos, deu aulas particulares para nós e os filhos do tio Gil, na sala da casa dele. Aprendi a ler e escrever com ela e ainda me lembro da alegria de saber decifrar o que estava escrito em livros. Lia tudo, as revistas "Jóias de Cristo", da Escola Dominical, a revista Almanaque, o dicionário Lello Ilustrado do meu pai e os livretos de propaganda do Biotônico Fontoura, com a história do Jeca Tatu. Todos na família, magricelas, anêmicos... Depois do Biotônico, ficam saudáveis, bem vestidos e calçados. Inclusive os porcos e galinhas na fazenda passam a usar sapatos.
Congregação Presbiteriana nos Braga |
dos Braga, onde havia também um pequeno templo presbiteriano, a uns dois quilômetros de pasto, uma matinha e o grotão do tio Gil com a plantação de milho e feijão. Um trilho bem a pique para subir e mais a pique ainda para descer, no meio da lavoura de café. Na volta cansados, a subida a pique... No inverno, usávamos blusas de frio pela manhã. Mas na volta, estava quentinho e o tio Joanilson, antes de ir também para o internato em Lajinha, costumava amarrar a blusa de frio na cintura dele, a minha ou da Etelvina na cintura da gente e, amarrando as duas mangas, nos puxava morro acima. Minha irmã Etelvina era magricela e, `as vezes, tio Joanilson a deitava no pescoço dele e pedia para ela ficar esticadinha. Carregava-a atravessada no pescoço como se fosse um cabo de vassoura. Minha mãe preparava a merenda, uma farofa de arroz, ovos e couve com farinha, colocada numa latinha em forma de cilindro (vinha com um pó, uma vitamina da qual não me lembro o nome), que ía no bolsinho de fora do embornal de livros, costurado por ela. De vez em quando, dávamos a volta por um caminho mais longo, pelo Tinguaciba, para que o tio Joanilson acompanhasse a namoradinha, Zulma, filha de uma prima da minha mãe, Zulina, e neta do Seu Vertulino, até `a casa dela.
A escola consistia de um cômodo grande, onde uma professora excelente e pessoa adorável, D. Arlete Vieira, que vinha de Pequiá todos os dias, dava aulas para uma turma de uns trinta ou mais alunos, de primeira `a quarta série. Passava deveres para um grupo e depois para outro e assim por diante. Nem sempre dava conta de manter todos ocupados. Eu gostava destes intervalos em que eu não tinha nada para fazer. Achava um lugar escondido num canto da sala onde o Alcione Drumond, (filho da tia Valmerinda, irmã do meu pai; tenho um outro primo, Alcione, filho da tia Lilica) num tom bem baixinho, lia histórias para mim. O Alcione era muito inteligente e muito engraçado também. A Nailda, uma garota que morava na casa da tia Nair e tio Osvaldo, e que se chamava Nair também, mas teve o "nome mudado" para Nailda, para diferenciar da tia Nair, me lembrou das vezes em que eu e ela acompanhávamos o Alcione, que estava apanhando frutas no pomar de um dos Braga. Corríamos e o deixávamos sozinho com medo de sermos apanhadas. Também me lembrou do nosso Correio, uma caixa que a professora colocara num dos cantos da sala para que trocássemos correspondência. Segundo ela, eu escrevi uma carta para ela, da qual nunca se esqueceu. Como seria bom se ela tivesse esta carta, mas, quem guarda cartas por mais de cinquenta anos? Eu era ótima em linguagem, mas detestava matemática.
"Vovô viu a uva", na Cartilha da Infância, e um livro de histórias do qual não me lembro o nome, mas que tinha, entre outras, a fábula do "Bicho Folharal", a história de uma raposa que queria beber água, mas estava com medo da onça... Passou mel no corpo e deitou-se nas folhas secas, que ficaram coladas no seu corpo. Ao chegar `a fonte, a onça lhe perguntou que bicho era, e ela responde: "Eu sou o Bicho Folharal". Só que a água lava o mel e as folhas começam a cair... Amava ler, mas detestava a tabuada.
Depois que o tio Joanilson foi para o internato, tio Filadelfo passou a ser o nosso líder. Certa vez, num dia em que os filhos do tio Gil não foram `a escola, resolvemos matar aula. Ficamos no grotão de manhã até `as onze e meia mais ou menos, simplesmente matando o tempo, tio Filadelfo esculpindo alguma coisa no barranco com o canivete. Houve um hora em que começou a chover e nos escondemos numa cabana feita para guardar o feijão colhido. Passado o tempo da aula, voltamos para casa. Só que um rapaz dos Braga havia passado na estrada e nos visto e quando chegamos em casa, todos já sabiam da nossa aventura. Meus pais não nos puniram, tampouco o vovô puniu o tio Filadelfo. Apenas nos disseram que aquela não era uma boa atitude e não deveríamos repetí-la.
No ano seguinte, D. Arlete foi lecionar na escola que abriram na fazenda do pai dela, Seu Joãozinho Vieira, em Pequiá. Uma professora recém-formada, de Guaçuí, veio lecionar na nossa escola. Calculo que não sabia nada sobre a vida na roça, pois, certa vez, levou-nos para um piquenique onde encontraríamos com a escola da D. Arlete, nossa ex-professora, num lugar chamado Profunda, a uns dois ou três quilômetros da nossa escola. Colocou-nos em fila e tivemos que caminhar um atrás do outro como se fôssemos um pelotão do Exército. Não estávamos acostumados com fila de espécie alguma, pois na nossa escola nem desfile de Sete de Setembro havia. E, quando alguns alunos começaram a pedir pra sair da fila para irem ao banheiro, ou melhor, ao mato, ela disse que estávamos querendo comer a merenda antes do piquenique.
Não me lembro se passamos por alguém no caminho, ou se alguém perguntou onde estávamos indo. Mas, caso tenhamos passado, deve ter parecido estranho ver um grupo de crianças indo para um piquenique com aquelas caras tristes, como se fosse um pelotão de execução (ou melhor, a ser executado). A maioria de nós caminhava em passos pequenos, com as pernas apertadas uma contra a outra para evitar que o xixi saísse.
A certa altura, não aguentei mais, abri as pernas e simplesmente fiz xixi na calça. Tio Filadelfo, sendo apenas alguns anos mais velho do que eu, mas um defensor ferrenho dos sobrinhos, vasculhou todo o seu repertório de palavras feias para xingar a professora. "Feda..." Naquele momento, a professora se deu conta de que estava errada e não fez nada contra ele, simplesmente, mandou que o resto da turma, meninos para um lado e meninas para o outro, fosse procurar um matinho para aliviar a bexiga. Para mim, entretanto, era tarde demais. Eu e minha irmã Etelvina estávamos usando vestidos novos, estampados de roxo e branco, com gola marinheiro, que minha mãe fizera para a ocasião. Eu estava com a calcinha molhada e fedendo a xixi.
Quando chegamos ao local do piquenique, Dona Arlete estava chegando com a turma dela. Traziam folhas de palmeiras nas mãos e cantavam "Salve lindo pendão da esperança...", o Hino `a Bandeira. Nós estávamos invejosos e ao mesmo tempo tristes pelo que tínhamos perdido, nossa querida Dona Arlete.
No caminho de volta, nossa professora resolveu passar por um caminho diferente, por dentro da mata do tio Gil no Tinguaciba, para tirar fotografias. Tio Filadelfo não quis acompanhá-la. Voltamos direto para casa. Não demorou muito e o ano letivo terminou e aquela professora retornou para Guaçuí e não voltou no ano seguinte. A maior parte da minha infância, eu tive raiva dela. Depois vim a entender que ela estava tendo tanta dificuldade de adaptação quanto nós. Era uma professora novata, que veio lecionar numa fazenda, tendo que comer uma comida com a qual provavelmente não estivesse acostumada, sofrendo saudades da família, dos amigos e da vida da cidade.
Fora a escola, nossa maior responsabilidade como crianças, além de pequenas obrigações como varrer o terreiro, que era dividido em partes para cada um (Etelvina e eu varríamos a parte de baixo do assoalho da casa, que era alto), era brincar com os primos, Edenilza, Dalva e Gerval e outras crianças da fazenda. Na matinha nos fundos da casa do tio Gil, agarrados aos cipós, voávamos, por alguns metros. Para a cozinhadinha oficial com supervisão de adultos, na casa vazia onde o Zico e a Biró haviam morado, macarrão com as rolinhas que o tio Filadelfo matava com atiradeira e pelotas de barro. E latas vazias para cozinhar ovinhos miniatura, de galinhas velhas, no fogãozinho clandestino de tijolos que meu pai não permitia, pois tinha medo de que nos queimássemos, mas que o tio Filadelfo fazia assim mesmo para nós, debaixo do assoalho alto da casa ou na beira do rio.
Descer de canoa de palmeira (a que dá coquinho) pasto abaixo, quebrar coquinhos no toco que servia de escada para o quarto do tio Jenus (do lado direito da casa e que dava para o terreiro), caçar casas de aranha no barranco, umas construções interessantes, uns tubos parecidos com papelão com tampa, e tirar cera de uma abelha pequenininha que fazia uns tuneizinhos amarelos, rendados, na porteira que dividia o terreiro do pasto... O broto de capim tinha um gostinho adocicado e também servia pra fazer assobio...
De vez em quando, eu e Etelvina dormíamos na casa do tio Gil. Edenilza e Dalva, Etelvina e eu, atravessadas numa cama de casal, tampávamos nossas cabeças com o cobertor e ficávamos imaginando coisas fascinantes que estávamos vendo. O quarto escuro e o cobertor faziam com que nossos olhos criassem cidades iluminadas e outras imagens que desejássemos.
Quase sempre havia visitas, colegas de internato dos tios, que vinham nas férias, o pastor ou um rapaz chamado Adevalde, que vinha pregar na congregação batista, que funcionava na sala da casa ligada `a venda do tio Gil.
Pastor Ambrósio era muito bom e bastante liberal. Uma vez, deixou que experimentássemos o suco de uva que estava preparando para servir como vinho na ceia, normalmente oferecido somente para os adultos "membros de uma igreja batista da mesma fé e ordem”. Um idealista e grande benfeitor, fundou o Ginásio Rui Barbosa em Lajinha e o internato, para onde trazia também, muitos estudantes cujas famílias não podiam pagar pelos estudos.
Casa da venda do tio Gil (anos mais tarde, quando já não existia a venda) Adelina, já crescida, está na foto com o irmão Abel e os filhos |
Nós acreditávamos em Papai Noel. Num Natal, quando ainda morávamos na casa amarela, minha irmã Etelvina descobriu nossos presentes escondidos, máquinas de costura de plástico, muitos dias antes do Natal. Meu pai disse que o Papai Noel tinha entregado a ele os presentes para que ele nos desse no Dia de Natal.
Mas no próximo Natal, já na casa do vovô, resolveu nos contar a verdade sobre o Papai Noel.
Estava escuro naquela noite e eu me lembro de que estávamos assentados no banco da cozinha da fazenda. Uma luz que não sei se era de um carro pequeno, ia passando lá longe, na estrada e ele nos disse que eram os faróis da caminhonete do Papai Noel. Nós já havíamos deixado nossos sapatos atrás da porta do quarto para que o Papai Noel deixasse nossos presentes. Enquanto ele nos distraía com a história da caminhonete do Papai Noel, minha mãe saiu pela porta da cozinha e entrou pela porta da sala, colocando os presentes nos sapatos. Quando as luzes da estrada sumiram, meu pai nos chamou para irmos ao quarto para ver se o Papai Noel já havia deixado os presentes. Estávamos impressionadas, e eu, particularmente, meio intrigada acerca da caminhonete do Papai Noel. Afinal, eu não vira o farol vindo em direção `a nossa casa. Mas pensava comigo "carro de Papai Noel" é misterioso mesmo... Ficamos eufóricas com os presentes e ainda estávamos comparando o que havíamos ganhado, quando ele resolveu nos contar o truque usado pela minha mãe.
Aliás, na celebração de Natal feita no palco do lado de fora da venda, tio Joanilson vestiu-se de Papai Noel e as crianças cantavam uma musiquinha assim:" Sai daqui seu bobo, velho impertinente, fazendo vergonha no meio da gente."
Nas férias, sempre havia algum colega de internato do tio Joassi ou tio Joanilson passando dias na fazenda. E as sociais no terreiro da fazenda eram uma oportunidade para a moçada socializar e flertar e se deliciar com “Olha o macaco na roda” ou “Locomotiva deu apito dentro do meu coração, ora vamos pra estação... funda lata...” as brincadeiras dirigidas pelo Biguito (Altair), filho do Seu Alvino Heringer, sobrinho do Vovô Américo e dono da fazenda vizinha.
Uma outra coisa da qual eu gostava era de ir a Laranja da Terra, que não chegava a ser nem uma vila, `a pracinha, na Fazenda do tio Luizinho, irmão do Vovô Américo, o centro do córrego, onde havia o campo, com times de futebol de salão e vôlei, muito bons. Minhas tias gostavam de ver os primos jogando e sempre comentavam a respeito dos mais bonitos, que interessavam a elas. Na pracinha, a Igreja Presbiteriana, o consultório de dentista do Jerônimo Werner, a venda do Dionésio e o cinema do Ademar, os dois últimos filhos do tio Luizinho. Este cinema, com cadeiras dobráveis, grande novidade para quem nunca tinha ido ao cinema, não durou muito tempo, mas foi onde assisti ao meu primeiro filme. A farmácia do Seu Pedro Werner era mais acima, perto da tia Valmira e da Fazenda Flor da Mata, da tia Alzira, viúva do tio Lindolfo, irmão do vovô Américo também.
Aliás, estávamos cercados de parentes por todos os lados. No Tinguaciba morava a Eli, do Zé Braga, filha do tio Elói, que visitávamos de vez em quando.
Na Fazenda do Seu Alvino, cercada de casas dos filhos, Airle e Olívia, Adenir e Oziel, Abgair (Bêga) e Valderez, Altair (Biguito) e Maria José (tia Zeca) e Adair (tio Chico) e Lurdes, que moravam do lado da laje do rio.
Airle foi o primeiro a ter um automóvel em Laranja da Terra. Meu pai tinha um caminhão F6, tio Gil e tio Afonso tinham jipes de capota de aço. Mas no dia em que o Airle chegou na casa do vovô Américo com a família num automóvel, fiquei impressionada... Antes ele tinha uma motocicleta, que também era novidade...
Certa vez, depois que o tio João mudou-se para Belo Horizonte e gravou um LP daqueles grandes e pesados, fomos `a casa do tio Aurino e tia Ambrosina, cunhado e irmã do Vovô Américo, que tinham uma vitrola, para ouvir o disco. Lembro-me de que o primeiro hino da lista era "O Senhor é o meu pastor..." e começava lento, suave. Mas quando chegava na parte "...Ainda que eu ande no vale da sombra da morte, não temerei...", ficava forte, tão forte, mais forte, pela voz forte de tenor do tio João.
Estávamos mais acostumados a ir `a casa do tio Eloi, do tio Brilhantino, tia Alzira, tio Luizinho (na casa do tio Afonso fomos poucas vezes) do que no tio Aurino. Mas acabamos passando o dia por lá, conversando, comendo e chupando jabuticaba. Tio Aurino havia comprado uma máquina de lavar roupas e com o maior entusiasmo, mostrou-nos como funcionava. Colocou uma toalha para lavar e quando terminou a operação, deixou-nos tocar na toalha para ver como estava praticamente seca.
Casa de veraneio (em construção) do tio Aurino (Guarapari) |
Rejane, neta do tio Aurino, diz que o PP-RUA era do tio Aurino e o Magalhães pilotava. O PP-DIB do Adiel. O pai dela, Adilson, contava que eles desciam na praia do Riacho (em Guarapari) e rebocavam os aviões até em casa (tio Aurino e tio Elói tinham casas de veraneio lá). O PP RUA ainda está em uso e bem bonito, em Cabo Frio, R.J, para onde foi vendido.
Tio Jenus uma vez nos deu um susto muito grande. Estava dirigindo o caminhão, passando na curva da estrada logo depois do encontro do Córrego Laranja da Terra com o Fama, e o caminhão tombou uns dez metros até parar na laje de pedra, que cobria a maior parte do córrego naquela altura. Ouvimos um barulho enorme e saímos correndo para ver o que tinha acontecido. O caminhão estava todo estragado, mas, milagrosamente, tio Jenus tinha apenas alguns arranhões.
Minha mãe sempre reclamou que quando chegou o momento dos meus avós escolherem entre ela e o tio Jenus para mandar para o internato, para continuar os estudos, (em Laranja da Terra só tinha até `a quarta série), eles escolheram o tio Jenus. Mandar uma mulher para estudar, seus irmãos comentavam, poderia ser um desperdício de dinheiro, pois ela se casaria, teria que criar os filhos e não teria uma carreira. Então o tio Jenus terminou o curso científico e não sei ao certo se fez o vestibular para o curso superior. Sei que tinha o sonho de ser médico, e teve uma época em que consideraram mandá-lo para Portugal ou outro país da América Latina para estudar, mas nunca chegou a ir. Ao invés disto, voltou para casa, fez muitas inovações na fazenda e teve o acidente com o caminhão.
Tio Afonso, irmão do vovô Américo, cuja primeira esposa havia falecido, casara-se em segundas núpcias com D. Nila, que tinha um filho chamado Nelson, cuja esposa Terezinha foi professora em Laranja da Terra. Tinham um apartamento mobiliado em Belo Horizonte e, certa vez, uns ladrões chegaram lá com um bilhete, supostamente do tio Afonso, para os tomadores de conta, pedindo que abrissem o apartamento, porque eles estavam se mudando. Os ladrões lotaram os caminhões e levaram tudo, com a ajuda do casal, que ainda teve o cuidado de embalar a mudança direitinho para não quebrar nada.
Tia Ilca e tio Cincinato (eu fui a daminha) |
Vovô ficou meio desapontado, mas deixou a decisão para a tia Ilca, que se decidiu por se casar assim mesmo.
Certo dia, o namorado dela, Cincinato, ficou lá na casa do vovô até mais tarde e a Etelvina, com o seu expediente natural disse para ele: "Ô Cincinato, já tá na hora de você ir embora, está ficando escuro..."
Eu fui a dama de honra do casamento deles. Meu vestido era igual ao da noiva, mas, na cabeça, ela usava uma grinalda de flores de cetim e o véu e eu apenas uma coroa de florzinhas, também de cetim. Nas mãos, ela levava um buquê e eu uma flor, do mesmo material da grinalda e buquê, com as alianças. Um bonito bolo, docinhos colocados em forminhas de papel em forma de flor, bastante chique para um casamento na roça. Leitoa assada, recheada com farofa e enfeitada com azeitonas fincadas em palitos.
Não me lembro bem da cerimônia, mas acho que foi realizada no terreiro, pois me lembro de ter deixado as alianças cairem na escada de cimento da frente da casa, uma escada de uns dez degraus, com uma mureta que usávamos como escorregador.
O fotógrafo contratado, Seu Bramantino Segal, de Lajinha, não apareceu; havia chovido muito nos dias antes do casamento. Desta forma, não houve a tradicional fotografia dos noivos em frente ao pé de murta no final do terreiro, como nos casamentos da minha mãe e tia Elzina. Poucos dias depois, fomos a Lajinha no F6 do meu pai para tirar as fotos no estúdio do Foto Bramante, onde estivemos em outras ocasiões também. Seu Bramantino arrumava a gente em frente `a grande cortina, depois se escondia atrás de um pano preto da máquina de tripé, para tirar a foto. Tia Ilca era muito elegante e a foto ficou muito boa, apesar de todos, até eu, estarmos sérios. Parece que as pessoas não podiam rir para as fotos.
No caminhão, de volta para casa, começou a chover. Tia Ilca e minha mãe estavam na cabina com o motorista, meu pai. Eu só gostava de andar na carroceria com o resto do pessoal. Tio Cincinato, o noivo, estendeu uma lona para nos proteger da chuva, improvisando uma tenda. Zico, o empregado do meu pai que me resgatou quando caí da pinguela, e a filha dele, Lurdes, estavam no caminhão também. Zico estava meio embriagado e, de vez em quando perguntava pra ela: "Cê vai bem aí, Lurdinha?" Meu pai, muito crítico, aprendeu esta frase e, toda vez que queria saber se estávamos bem, perguntava "Cê vai bem aí, Lurdinha?"
Tia Ilca e tio Cincinato íam morar no Norte, no Córrego Azul, onde o vovô Américo havia comprado um sítio. Vários irmãos dela já moravam em Itabira, tia Elzina, tio Joel, tio Jeronil, além do Vovô Fildelfo e tio Reginaldo, pai e irmão da vovó Leonina, que foram os primeiros da família a irem para lá.
Eu gostava muito da tia Ilca e do tio Cincinato, e dizia que iria com eles. Tio Cincinato havia me dado uma foto três por quatro dele, que guardo até hoje, mais de cinquenta anos depois (tio Circinado ficou viúvo e depois que eu e outros primos, incluindo o filho dele Gladstone, já morávamos em uma república da família em Boston, ele veio morar conosco. Ele mesmo me contou os detalhes da história para colocar nas minhas memórias. Casou-se novamente com a nossa vizinha do andar de cima, Zenir Eller).
Tia Ilca tocava o hamônio e eu gostava de acompanhá-la e quando soube que ela não iria levar o harmônio consigo, achei um absurdo. Tia Elma e tio João também tocavam, mas eu sempre associei o instrumento com a tia Ilca.
Menos de um ano e tia Ilca voltou, não exatamente para visitar, mas para ter a Gláucia. Lembro-me das batas de grávida que usava, com saias, uma moda muito bonita. Tia Ilca era chique por natureza.
Também das sopas de galinha, feitas com farinha de milho por semanas a fio, que eram a norma para as mulheres que davam `a luz, na época, mas que toda a família comia. Hum... delícia...
O Pito Aceso
Durante o dia, com um pouco de esforço, podia-se ver a pequena casa de barro batido no topo da montanha, que ficava além do rio, ao longe, do lado da cozinha da fazenda. Mas era `a noite, quando tudo estava calmo, com a luz fraca do gerador, que podíamos notar melhor a habitação lá em cima, ou melhor, o ponto brilhante no meio da escuridão.
Houve um tempo em que uma mulher que morava no Pito aceso, era lavadeira da minha avó, que lá nascia uma água muito boa. Perguntei-lhe quem levava a roupa da fazenda pra lá, mas ela não se lembrava se os meus tios levavam ou se a mulher buscava. Se buscava, penso que devia ser numa carroça. E uma carroça bem grande, puxada por um animal bem forte...
Nunca cheguei a saber o verdadeiro sobrenome da família "Pescadô", uma vez que pescador era um apelido dado a eles por terem o hábito de pescar, não pescaria profissional, apenas uns lambarizinhos ou acarás (que chamamos apenas carás), no córrego, perto da casa deles. Eram uma família numerosa, que trabalhava para o meu pai, isto se trabalho pudesse ser uma metáfora para pescaria, pois estavam quase todo o tempo pescando, além de tomarem umas pingas. Um casal de idosos, três filhos casados e um punhado de crianças sujas e malnutridas, amontoados em duas casas no terreiro uma da outra.
Havia uma garota nesta família cujo nome era Tereza e minha mãe resolveu adotá-la. A família parecia estar contente de vê-la morando na casa grande da fazenda. Minha mãe e tia Edil apararam e pentearam os cabelos dela, deram-lhe um bom banho, cortaram-lhe as unhas, fizeram roupas novas para ela, compraram-lhe sapatos. Parecia que havia se transformado em outra pessoa. Tanto que a tia Edil sugeriu que lhe trocassem o nome. Decidiram-se por Rute, com o qual a menina não só concordou, mas passou a responder prontamente. A família passou a chamá-la de Rute, também.
Igreja Presbiteriana de Laranja da Terra |
Mas nem tudo muda de um instante para o outro.
Era o dia da inauguração do novo templo da Igreja Presbiteriana de Laranja da Terra, na pracinha, ou seja, na cabeceira do Córrego Laranja da Terra, onde havia o povoado.
Quando chegaram `a igreja, minha mãe pegou a Rute para ajudá-la a descer da carroceria do caminhão. Meu pai, que estava em baixo, esperando para pegá-la, fez a maior careta, deixando minha mãe intrigada. Meu pai cochichou no ouvido da minha mãe... A garota não tinha costume de usar roupa de baixo e, apesar do vestido novo, não havia colocado a calcinha. O vestido era compridinho e como minha mãe não havia trazido roupas extras para a menina, ela continuou como estava.
Pouco depois, a família foi assistir a um culto na casa do vovô e a irmã dela roubou carne seca. Mas, na hora de ir embora, não pode levar e escondeu debaixo do assoalho.
No dia seguinte, o cachorro achou a carne seca. A Rute, que sabia do fato, contou que a irmã tinha pegado.
Rute não ficou muito tempo lá em casa, nem conservou o nome, depois que a família a levou de volta para a casa deles. Mudaram-se e nunca mais ouvi falar dos "Pescadô".
Mas antes de se mudarem, outro episódio aconteceu. Certo dia, estava amanhecendo, quando dois irmãos Pescadô chegaram na casa do vovô chamando "Sô Amerco!!! Sô Amerco!!!".
Vovô acordou assustado e consequentemente todos os da casa, para verem os "Pescadô" segurando um homem que morava na vizinhança, alto e forte, com as mãos para trás, a boca sangrando pelos socos que recebera.
"Esse safado tava robano galinha no terrero do Sô Gil."
Mostraram uma corda de pião e uma sacolinha de milho, que, segundo eles, o homem estava usando para pegar as galinhas. O homem era J.D., cuja primeira letra, o J, é a primeira letra do seu nome e o D, a primeira letra do apelido, que significa forte e lhe fora dado pelo fato de ter tanta força, que parecia poder desdobrar qualquer um em queda de braço. Mas, tal força, parecia não coincidir com sua capacidade mental limitada. Por isto, além de trabalhar, por vezes roubava.
Ficamos todos extremamente chocados com a cena. Vovô Américo simplesmente pediu que largassem o homem, não sem antes aconselhá-lo a que não roubasse mais. Nunca soube que o fizesse depois disto.
Meu avô contava que um sobrinho dele tinha um cachorro que ficou doido e mordeu uma menina que morava na fazenda dele. A menina teve que ser morta com uma injeção. Depois disto, ele tomou pavor de cachorros e todos os sem dono que apareciam por lá, ele mandava matar e plantar um pé de café por cima da cova. Fez uma "lavoura de cachorros".
De vez em quando, quem passava na fazenda, ou víamos na estrada, era o João Bico, um rapaz de lábios grandes e prominentes, que morava na casa do Alberto Heringer, filho do tio Lindolfo Heringer, muito bom e caridoso. João Bico também tinha problemas mentais e andava empurrando uma carrocinha. Tinha muito medo da "captura", nome que davam `a polícia na época.
Outro que, para mim, se tornou um personagem legendário, foi o Seu Sinfrônio. Perdera uma mão quando soltava um foguete e usava uma capinha de couro para proteger o cotoco do braço. O modo como meu pai se referia a ele para nos advertir dos perigos de soltar foguetes, fazia-nos pensar nele, não como um ser humano normal, exceto pela falta da mão, mas como um símbolo da má sorte, originada na imprudência. Para mim, não importava se ele tinha uma outra mão, dois pés, dois olhos, dois braços, uma cabeça... Nem se era bom ou mal, se tinha esposa ou filhos, se trabalhava, mesmo tendo apenas uma mão. Via-o apenas como o símbolo da imprudência, mesmo que o seu ato tivesse ocorrido muitos anos atrás e já tivesse amadurecido tanto que nem soltasse mais foguetes. Ou, se o fizesse, tomasse bastante cuidado.
Dia de Finados
Dia 2 de novembro, o "Dia de Finados", era um dia de emoções controversas para mim. A excitação começava logo cedo, quando colhíamos flores, fazíamos os buquês, tomávamos banho e trocávamos de roupa. Depois caminhávamos a pé mais ou menos um quilômetro e meio até o cemitério na Fazenda do Seu Alvino, sobrinho do Vovô Américo. Era excitante ouvir as histórias de parentes que tinham vivido num outro tempo, muito tempo atrás, de quem talvez nunca teríamos ouvido se não fosse pelo Dia de Finados.
Por outro lado, era triste lembrar os que haviam morrido recentemente, como a Vovó Leonina. Vovó Etelvina, mãe do meu pai e o Tio Osvaldo, irmão, haviam falecido também, todos dois de câncer no intestino, dois dias de diferença um do outro. Sentia tristeza por nós e por todos os que tinham saudades deles, especialmente do tio Filadelfo, que perdera a mãe, vovó Leonina, com apenas sete anos de idade.
O cemitério estaria capinado e as poucas catacumbas pintadas de novo. Seu Altivo Maria, o regente do coral da congregação, que morava perto do cemitério, recolhia dinheiro dos fazendeiros para capinar o cemitério e pintar as catacumbas dos parentes daqueles que desejassem.
A maior parte das sepulturas eram apenas montes de terra como se fossem barrigas grávidas, quase todas com uma cruz de madeira na cabeceira, algumas com o nome e a data de nascimento e morte da pessoa ali sepultada.
Havia duas catacumbas de cimento, grandes, bastante antigas, uma no alto do lado esquerdo do cemitério era a do Tio Lindolfo, irmão do Vovô Américo; a outra do lado direito, do Vovô Alvim, pai do meu pai, que morrera muito antes de eu nascer. Vovó Etelvina fora enterrada na mesma catacumba, a coroa de flores metálica, que ainda era nova, enfeitava a catacumba.
Havia apenas uma catacumba de azulejos pretos, a do tio Osvaldo, que tinha também uma coroa de flores metálica igual `a da vovó. Tia Nair, a viúva dele, já deveria ter vindo ao cemitério, pois a catacumba dele estava cheia de flores, os azulejos bem lavados. Tia Nair, como sempre, tinha a casa mais limpa e o jardim mais bonito da região.
No mesmo ano em que Vovó Etelvina e tio Osvaldo morreram de câncer, perdemos uma prima, a Maria Etelvina, filha do tio Astrogildo, de câncer no olho. Lembro-me de vê-la com o olho arroxeado e inchado, chorando no colo do pai dela. Interessante é que, se sua sepultura estava ou não naquele cemitério, não sei. Talvez tivesse sido enterrada em outro cemitério.
Do lado esquerdo da sepultura do tio Osvaldo, ficava a do Clair, filho da tia Valmira, irmã do meu pai, que morrera com doze anos num acidente de carro. Foi um acontecimento muito triste. Ele e os irmãos haviam acabado de chegar do internato em Alto Jequitibá.
Mais abaixo, no centro do cemitério, três catacumbas caiadas de branco, uma grande no centro, da Vovó Leonina e duas pequenas dos lados, dos filhos do tio Gil que morreram de doenças infantis. Gediel, o garoto, era mais ou menos da idade da Etelvina, minha irmã; Edinéia, a menina, um pouco mais nova.
`As vezes, eu ficava intrigada porque quase todos os tios e tias haviam perdido algum filho para o sarampo ou verminoses e a minha mãe e meu pai, não. Nunca tiveram um filho que nascera morto ou um aborto, o que parecia a história de quase todas as casas na época. Além de terem uma família pequena, apenas três garotas, meu pai, que vivera no Rio de Janeiro por muitos anos, tinha seus próprios meios anticoncepcionais (depois fiquei sabendo que usavam tabela) e era muito preocupado com a saúde. Ele nos tratava com homeopatia, remédios sem gosto de nada, apenas umas gotinhas parecidas com álcool numa colher de água. Acônito, briônia, beladona, ipecacuanha. Também estava alerta para qualquer sinal de febre alta ou "ataque de bichas", como se chamava quando as lombrigas atacavam. Certa vez, um filho de um tio já estava ficando roxo, se asfixiando pois as lombrigas haviam se juntado na garganta dele. Meu pai pegou uma colher, abriu `a força a sua boca que estava travada e colocou uma solução de hortelã amassada garganta abaixo, salvando-lhe a vida.
Tio Gil mandara cortar pedras de mármore com os nomes gravados para colocar sobre as catacumbas da vovó Leonina, do Gediel e da Edinéia, mas as pedras ficaram muito grandes para as catacumbas e continuavam por muito tempo atrás de um móvel na casa dele.
Andando de cima abaixo no cemitério, colocando flores sobre as sepulturas, ouvindo histórias dos mortos e da causa das mortes, chorando por eles, me fazia sentir bem. Penso que a tendência masoquista, a atração pelo lado dramático da vida, o gosto pela tragédia, comuns `a natureza humana, me faziam voltar para casa uma criança feliz, ansiosa para que chegasse o próximo Dia de Finados para voltar ao cemitério.
Viagem a Belo Horizonte
Tio João havia se mudado para Belo Horizonte para continuar os estudos no Colégio Batista. Acabou comprando uma pensão e levou a tia Elma e a Maria Veríssimo para trabalhar lá.
Maria Veríssimo havia sido empregada da vovó Leonina e babá do tio João, e mesmo depois que se casara com o Zé Rita (José, filho de uma mulher chamada Rita), bem mais novo do que ela, e alcoólatra, continuara morando na fazenda e trabalhando para a vovó. Por vezes, quando Maria se cansava dos abusos, separava-se dele e vinha morar dentro da casa do vovô novamente. Ela também gostava de uma pinga, mas nunca bebia para ficar bêbada.
Numa destas épocas em que estavam aparentemente separados de vez, tio João a levou para trabalhar na pensão e mesmo depois de ter vendido o negócio e entrado para o DI (Departamento de Instrução) da Polícia Militar, ela continuou trabalhando para ele, no apartamento que dividia com colegas. Maria adorava uniformes militares, especialmente os da Banda da Polícia Militar, que ela chamava de "musgueiros" (fazedores da música). Maria cozinhava muito bem, fazia uma carne assada deliciosa e era bastante vaidosa, tendo o cuidado de ir ao salão de vez em quando alisar os cabelos.
Na época em que tio João tinha a pensão, meu pai resolveu nos levar para conhecer Belo Horizonte, mais ou menos uns trezentos e cinquenta quilômetros de distância. Pegamos o ônibus para Manhumirim e o trem da Leopoldina para Manhuaçu, uma novidade, pois era a primeira vez que andávamos de trem. Ficamos hospedados no Hotel Zapalá. Etelvina, muito curiosa, estava mexendo nos arranjos de flores e foi repreendida pela dona do hotel.
`A noite, fomos visitar o tio Quinquim e a tia Lia, irmão e cunhada da vovó Etelvina, mãe do meu pai, que moravam na Rua Monsenhor Gonzalez, em Manhuaçu. (Na volta de Belo Horizonte, lembro-me de que visitamos o tio Luciano e a tia Maria, irmão e cunhada do vovô Américo em Manhuaçu também).
No dia seguinte, pegamos o ônibus para Belo Horizonte. Estávamos acostumadas a viajar mais ou menos a mesma distância quando íamos visitar os tios que moravam no Norte, em Itabira (mais tarde Itabirinha, para diferenciar de Itabira do Mato Dentro) mas era por estradas poeirentas e pequenas cidades.
Vestido da Clarinda com bordado da cantiga do Sabiá |
Meu pai se tornou amigo do sírio-libanês que havia vendido a pensão para o tio João, o Seu Tufi, e foi na casa dele que fomos apresentadas pela primeira vez a um caixote falante com tela arredondada, a televisão. Minha irmã Etelvina, não podendo conter a curiosidade, colocou a mão na tela e foi olhar lá atrás da televisão para ver de onde saiam aquelas imagens.
Uma coisa que me intrigava, mas que não perguntei pra ninguém, era como os sinais de trânsito sabiam quando vinham carros de um lado ou do outro para ficarem verdes ou vermelhos. Na minha cabeça, tinha a impressão de que o sinal obedecia ao fluxo de carros e não o oposto.
Adicionar legenda |
Um professor por natureza, e tendo morado no Rio de Janeiro por oito anos enquanto servia o Exército, meu pai queria nos mostrar tudo o que pudesse. O Parque Municipal com os balanços e pedalinhos, o Aeroporto da Pampulha, o Zoológico, onde fiquei impressionada, não com o leão ou o tigre, ou a zebra, mas com um animal que achei horrível: o macaco mandril, com a sua bunda vermelha que eu nunca esqueci.
Levou-nos para andar de bonde, de trolleybus (ônibus elétrico, de suspensório), a uma Feira de Amostra de Pedras Preciosas e até a uma granja de galinhas, com incubadoras e todas as galinhas brancas, bem diferentes das galinhas do nosso galinheiro na fazenda.
O único lugar onde meu pai levou apenas minha mãe, foi ao Museu de Cera, pois não era permitida a entrada de crianças. Eu, muito mimada, reclamei que crianças deveriam ter os mesmos direitos dos adultos. Quando cresci e fui ver um Museu de Cera, as deformidades e abnormalidades mostradas em cera me fizeram querer que ele fosse proibido para adultos também.
Fomos, também, `a casa de uma prima da minha mãe, Iraci, professora e funcionária do Ministério da Educação, casada com um Engenheiro Agrônomo, escritor e político, Abdênago Lisboa. Quando chegamos, ele perguntou ao meu pai como tinha conseguido achar o endereço naquela cidade grande. Meu pai não respondeu, mas depois falou conosco que um peixe acostumado a nadar no oceano, não se perderia num córrego. Morara no Rio de Janeiro por oito anos, e Belo Horizonte para ele era fácil. O homem continuou perguntando para a esposa dele se minha mãe, a prima, também era das "locas" onde ela havia nascido (Laranja da Terra). O resto da tarde, entretanto, nos tratou muito bem e amigavelmente, e Iraci serviu um jantar delicioso. E a sua falta de cortesia parecia ser só a casca, pois a sogra dele, tia Verônica, irmã do vovô Américo, morava com eles.
Mas, anos mais tarde, quando estávamos morando em Itabirinha, ele esteve lá, fazendo campanha política para Deputado Estadual e chegou `a nossa casa. Foi bem recebido e também eleito, mas duvido que tenha ganhado votos dos parentes caipiras.
Trouxe de volta revistas "Nosso amiguinho", um tesouro. Agora teria muito mais para ler do que apenas a Revista Jóias de Cristo (da congregação), os livros da escola, o Almanaque, a revistinha do Jeca Tatu que vinha com o Biotônico Fontoura e o grosso Dicionário Lello Ilustrado do meu pai. (Mais tarde, descobriria os livros guardados na gaveta do guarda-roupa com espelho do lado de fora, um livro sobre o Duque de Caxias e a Guerra do Paraguai, alguns romances de Machado de Assis, e "Eles também são humanos", de Himain Lacerda, um autor que estivera na congregação. Na mesma gaveta, a caixinha do pesado anel de ouro com as suas iniciais, NFG, Norival Fortunato Gomes e algumas fotos antigas, de colegas do Exército ou cartões e fotos de ex-namoradas. Minha mãe nem se importava com os últimas.
Essa viagem a Belo Horizonte foi uma das mais importantes excursões educacionais que eu já tive. Só uma coisa meu pai se esqueceu de explicar para nós. Pelo menos não explicou antecipadamente. Foi quando estávamos indo para Belo Horizonte. A estrada estava em obras, havia escavadeiras e tratores trabalhando e, a uma certa altura, perto de Abre-Campo, um cheiro forte de alcatrão. Minha irmã Etelvina, sempre a primeira a ver e fazer as coisas, vendo que estavam passando um rolo em cima de uma camada grossa de um material preto e brilhoso, perguntou para minha mãe o que era aquilo. Minha mãe também não sabia. Ela só fez "sh... sh... sh..." com medo de que alguém ouvisse a conversa. Então, perguntou ao meu pai, que explicou para ela e para nós que aquela coisa preta era chamada asfalto. O ônibus começou a rodar muito mais suavemente daquele ponto em diante.
Mudança para o Norte (Norte do Rio Doce)
Ainda com escuro, o caminhão se afastava de mansinho. O vovô, a Margarida e o tio Filadelfo ficaram no terreiro... Etelvina e eu de calças compridas, eu feliz por ter convencido meu pai a deixar-nos usá-las. Mas com um nó na garganta...e os olhos marejados de pena do nosso Tio Definho.
- História dos Ancestrais - Miscegenação-
Sua filha Maria (Lilica, mãe do Juca), que estava no internato, teve que deixar a escola e voltar para casa. Narrava estes fatos aos filhos, com grande ressentimento da pessoa que pegara a assinatura do pai fraudulentamente, e dos R, compradores de café com que o pai negociava.
Vovô pediu ao Seu Alvino Heringer, apenas três meses para se mudar, enquanto construía um rancho numa terra que tinha no Córrego Laranja da Terra . Lá construiu tudo novamente, moinho. monjolo, lavouras de café e e um sobrado... Quando nasci, ele já havia falecido, mas, quando criança, eu gostava de deitar no assoalho da sala grande no segundo andar e ficar admirando as fotos nas paredes e ouvindo o relógio de carrilhão, marcando as horas e cantando “Hora certa, hora certa”...
Alguns anos atrás, minha prima Mariza, que queria conseguir a cidadania italiana, foi, juntamente com meu irmão Fábio, procurar o assentamento do nascimento do Vovô Alvim, em Divino de Carangola, mas a igreja onde tinha sido batizado não existia mais e os arquivos haviam sido transferidos para a matriz em Carangola. Mas alguns dos livros transferidos haviam se extraviado, incluindo o do ano em que o Vovô Alvim nasceu.
Transcrição do Artigo sobre o Comendador Leite na Revista de Lajinha
Francisco Tomaz Leite Ribeiro, este era o nome verdadeiro do Comendador Leite. Alguns registros históricos que encontramos na Prefeitura, Câmara e Escolas de Lajinha, acrescentam Aquino ao seu nome, porem nos autos do Inventário dos Bens deixados por seu pai, está bem claro que seu nome não era em homenagem ao Santo Tomaz de Aquino. O nome Aquino é, na realidade, patronímico usado por alguns descendentes da tradicional família Leite Ribeiro.
Conforme informações precisas do Professor Armando Vidal Leite Ribeiro, o Comendador Leite era filho do Capitão Antônio Leite Ribeiro, nascido em São João Del Rey, no ano de 1773 e falecido em 16/05/1848 em Nazaré, na Fazenda “Ribeirão do Fundo”. A sua mãe chamava-se Bernardina Constança de Barros. O inventário dos bens do casal foi requerido em fevereiro de 1856, ora recolhido ao Museu Histórico e Artístico de São João Del Rey.
O Capitão Antônio Leite Ribeiro, pai do Comendador Leite, era filho do Sargento Mor Joseph Leite Ribeiro e dona Escolástica Maria de Jesus. O Sargento Mor Joseph Leite Ribeiro era natural de Santa Eulália do Barroso, Termo de Guimarães, Arcebispo de Braga – Portugal, onde nasceu em 1723. Casou-se em 1764 e faleceu 04/10/1801, em São João Del Rey.
Foram seus pais: Francisco Leite Ribeiro e Isabel Ferreira, nascidos e falecidos em Portugal.
Os estudos genealógicos da Família Leite Ribeiro, chegam a Theodoredo – quarto Rei Visigodo da Espanha, eleito em 419 da Era Cristã, no ano 451. A geração de nobres é extensa e chega a D. Sancha, Rainha de Leão e seu marido, D. Fernando, primeiro rei de Castela.
Já a árvore genealógica de Dona Escolástica Maria de Jesus Moraes, avó do Comendador Leite, passa pela Espanha e Portugal e remonta a Dom Fernando e sua quinta mulher, Dona Isabel de França.
A família abrange a mais variada coleção de patronímicos, mas onde predominam Leite Ribeiro, Ribeiro Leite, Vidal Leite Ribeiro, Ribeiro de Almeida, Teixeira Leite, Leite de Barros, Ferreira Leite, Leite do Vale, Leite Guimarães, Aquino Leite. Os estudos sobre a família são extensos e vários livros se ocupam do assunto. Autores consagrados, como Armando Vidal Leite Ribeiro e Afonso E. de Taunay nos legaram informações preciosíssimas.
Como vimos, Comendador Leite era descendente de importante família, pioneira e fundadora de diversas cidades em Minas, São Paulo e Rio de Janeiro. Contudo, o insigne Comendador da Ordem de Cristo, deixou imensas fazendas de sua família e os tios Barões e Baronesas, Condes e Condessas do Brasil Império para se aventurar por terras cobertas de matas e iniciar, com seu suor, um trabalho que se estenderia por mais de um século, até chegar `a nossa geração.
Comendador Leite era o sexto de uma prole de treze irmãos, todos portadores de títullos, honrarias e propriedades, de extensas glebas de terras em Minas e Rio de Janeiro.
(Texto extraído do original editado pelo Jornal Conunicatto, de Iúna, Espírito Santo, Roberto Carlos Scardini Justo Marcondi, advogado, professor e historiador.
(Ilustração: foto com a seguinte legenda: José Leite Ribeiro, filho do Comendador Leite)..Apesar do artigo na revista dizer que ele pertencia `a Ordem de Cristo, minha intuição e pesquisa me levam a pensar que é Ordem da Rosa. A Ordem de Cristo é muito antiga (1319). Segundo a Wilkipidia "A Ordem de Nosso Senhor Jesus Cristo originalmente era uma ordem religiosa e militar, criada a 14 de março de 1319 pela bula pontifícia Ad ea ex quibus cultus augeatur do Papa João XXII, que, deste modo, atendia aos pedidos do rei Dom Dinis. Recebeu o nome de Ordem dos Cavaleiros de Nosso Senhor Jesus Cristo ou Ordem da Milícia de Nosso Senhor Jesus Cristo e foi herdeira das propriedades e privilégios da Ordem do Templo".
Abotoadura Comendador Leite, uma moeda de 250 réis. |
Vaso de cerâmica do Comendador Leite, para guardar água (60 litros). |
Perguntei-lhe se sabia os nomes dos genros do Comendador Leite, pois no site Wilkpeida, sob o título História de Lajinha consta que "Segundo a tradição, foi Francisco Mateus Laranja quem dirigiu os trabalhos de derrubada da mata onde viria a crescer o povoado. Em 1910, o desbravador, junto com José Lucas de Barros, recebeu de Antônio Pedro Garcia, genro do Comendador Leite, um alqueire de terra onde foi erguida uma capela em honra a Nossa Senhora de Nazaré." Ele disse que também não sabia. Mas que Lajinha se chamava Angola, pois tinha muito Capim Angola (Shirley pode ter confundido quando disse que Lajinha se chamava Capim Gordura antes de se chamar Lajinha) e que o Rio S. Domingos não era drenado no local. O Comendador mandou que os escravos drenassem o rio e então apareceu a laje, que deu origem ao nome Lajinha. Pediram `a viúva um pedaço de terra no Areado e ela disse que dava na Angola.
Joaquim Gomes Coelho - Vovô Quinca Silvestre
Nota: Depois de uns quarenta anos sem ver, encontrei me no Facebook, com a filha da D. Efigênia Rodrigues de Oliveira (prima da minha avó Etelvina), Sebastiana de Oliveira Ferraz, residente joje em Espera Feliz, a qual me deu várias informações sobre a Família Gomes (primos da Vovó Etelvina). Disse me que a D. Maria Rodrigues, que eu pensava ser prima do meu pai, era viúva de Antônio Rodrigues, este irmão da mãe dele, Efigênia, e primo da Vovó Etelvina. Conheceu o Aristes (Aristides), Titina (Ernestina) e Sinhá (Efigênia, também), mas não sabe de quem eram filhos. Sebastiana teve dois irmãos, Maria e José. É viúva de José Gomes Ferraz e tem os seguintes filhos: Maria de Fátima, Cleone e Lourdes, José Francisco, Ieda, Luciana e Luciene.
You sent
Joaquim Gomes Coelho e filhas Etelvina (mãe do meu pai),
Joaquina (tia Quininha),
mãe de Nilton Gomes (Bililim) e tia Maria (mãe do Seu Júlio Vieira e
Tarcília)
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Caderneta de Anotações do meu bisavô Joaquim Gomes Coelho
O filho do primo do meu pai, Júlio Gomes Domingos, filho do Jojô (José Joanez Domingos) e da Leinice Vieira Gomes, me enviou o documento abaixo. Seus pais são primos, ambos descendentes do vovô Quinca (Joaquim Gomes Coelho) e a Leinice conserva uma cadernetinha dele, que o pai dela, Seu Júlio Vieira Gomes, filho da Maria, recebeu do avô e guardava com muito cuidado. Eram as anotações de todos os eventos importantes na vida dele.
"Faleceu o meu sogro Francisco Thomas Leite Ribeiro no dia (ilegível) de janeiro de 1893". |
Casamento do Tio Dedé e Tia Zilpha
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Vovô Quinca, com o neto Sidney, tio tio Brilhantino, com as netas Eny e Carmelita (descalço), Vovô Américo (de terno escuro perto do Vovô Quinca. |
Tio Elói, Vovô Américo e tio Brilhantino |
Vovô Américo e vovó Leonina
no Rio de Janeiro (anos 20)
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1. 1Maria de Freitas (b. 11/06/1869 em São Francisco de Paula, atual Trajano de Moraes, RJ)
2. Ana de Freitas (b. 22/08/1870 em São Francisco de Paula, atual Trajano de Moraes, RJ)
3. Cândida de Freitas (b. 24/06/1872 em São Francisco de Paula, atual Trajano de Moraes, RJ)
4. Joana de Freitas (b. 31/08/1873 em São Francisco de Paula, atual Trajano de Moraes, RJ)
5. Georgiana Alves de Freitas (n. 12/08/1874 em São Francisco de Paula, atual Trajano de Moraes, RJ; m. 1948 em Iúna, ES)
6. Filadelfo Mariano de Freitas (n. 07/12/1875 em São Francisco de Paula, atual Trajano de Moraes, RJ; m. 02/04/1967 em Itabirinha de Mantena, MG)
7. Júlia Cândida de Freitas (n. 28/11/1881 em Carangola)
8. Teodora Cândida de Freitas
9. Leonora de Freitas
10. Micaela de Freitas
11. Otaviano de Freitas
12. Nestora Adriana de Freitas (n. aprox. 1890)
13. Rafaela de Freitas
14. Antenorgenes de Freitas (n. 16/07/1894 em Carangola, MG (?); m. 10/09/1963 em Governador Valadares, MG)
Minha mãe contava que os seus pais tiveram muita dificuldade em manter uma vaca leiteira para tratar das crianças, pois na época, havia tantos mosquitos que o animal não resistia e morria. Passaram a criar uma cabrita, amarrada perto da casa, para tal fim. Tia Elzina contava que ela e o tio Gil tiveram uma babá por nome Maria José, que tinha o apelido de Bezé.
Vovó Arminda e tio Reginaldo (filho dela)
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Alcino, Vovó Arminda e Vovó Leonina
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Tia Verônica, Vovó Arminda | e Vovó Etelvina |
estão no Rio de Janeiro, muito elegantes, de chapéus.
Norival Fortunato Gomes, meu pai, foi escolhido para o Batalhão de Guardas Presidencial. Apenas os de boa aparência e com certa classe eram escolhidos. |
Batalhão de Guardas Rio de Janeiro (Meu pai, Norival, no meio, em pé) |
Casamento dos meus pais (Erandi e Norival) 1952 |
Eu (Leonina) aos seis meses de idade, com meu bico vermelho de balãozinho |